quarta-feira, 27 de agosto de 2008

1917 A 1928

Embora se não saiba com rigor qual seria o número populacional da Ribeira Quente na altura da bênção e inauguração do seu terceiro templo, podemos aceitar a ideia de que a mesma não seria inferior a mil e setecentas pessoas, visto que, aparecendo pela primeira vez documentalmente uma estatística abrangente que inclui o lugar da Ribeira Quente, a mesma lhe dê nesse ano de 1864 uma população de 1065, para depois, já no ano de 1900 lhe ser dada uma população de 1463 pessoas. Por isso é lógico que dezassete anos depois, no ano da inauguração, no mínimo o número de pessoas acima relativamente mencionadas fosse uma aproximação da verdade.
De 1911 a 1949 não existem números estatísticos que mencionem qualquer censo acerca da Ribeira Quente, visto a população desta localidade estar anexada à da Igreja Matriz da Povoação, por ter passado a ser parte integrante da mesma depois de perder o direito de ser paróquia autónoma. Por isso, estatisticamente falando, só no ano de 1950 aparece oficialmente a Ribeira Quente já feita freguesia e com uma população de 2126 almas.
Fosse como fosse, a igreja então ao tempo inaugurada naquele ano de 1917, foi definitivamente dimensionada para o futuro, visto o lugar da Ribeira Quente por justa posição geográfica, ser um lugar encravado e financeiramente limitado.
No percurso da sua existência até ao presente, este templo de São Paulo jamais foi alterado no seu aspecto de igreja de uma só nave. Só as suas duas sacristias laterais sofreram algumas transformações que vão ser mencionadas.
Com um alçado principal alegre e leve porque a sua cantaria é pobre, no entanto a sua situação sobranceira dá-lhe um aspecto de imponência.
A sua torre sineira antes era um pequeno museu do passado porque encerrava dentro de si um grande pedaço de história. Esta história encontra-se agora com os Sinos em exposição no Baptistério da Igreja.
O Sino que anteriormente estava do lado nascente, quer pelo seu aspecto de fabrico tosco muito rudimentar, quer pela corrosão causada pelas salseiradas do mar, logo nos mostra ter sido o único sino que veio da primitiva Ermida de São Paulo, e que tudo indica ter sido fabricado nesta ilha.
O Sino que anteriormente estava na janela sineira do lado poente confunde-nos por serem reais mas enigmáticos os dizeres que nele se lêem em nítido relevo:
"SSmo. DE SAO PAULO OFERECIDO POR I. (?) M. NOGUEIRA, BELLAS V FEZ LISBA 1489"
Na parte superior esterior tem o mesmo uma imagem do Apóstolo São Paulo em relevo bastante vivo.
Oferecido pela mesma família que ofereceu os outros dois sinos em datas bastante posteriores, tudo nos leva a crer que a data de 1489 foi uma ESMERALDA de enfeite apropriado.
O sino que estava do lado sul, que é o mais rico no tamanho e nos dizers, ao cimo, na parte virada para o interior da torre, tem uma quadrícula moldada e no centro da mesma em letra relevante:
MANUEL ANTONIO MARTINS O FES
e logo mais abaixo:
CONSTRUIDO EM LISBOA NA FÁBRICA DA RUA AUGUSTA NO ANO DE 1839
JOZE MATHEUS NOGUEIRA O MANDOU FAZER PARA A IGREJA DE SÃO PAULO DA RIBEIRA QUENTE
O mais pequeno dos sinos, o que estava na janela do lado norte tem na parte superior exposta uma Cruz da Natividade bastante relevante, mas os dizeres não são, como os dois anteriores, em relevo mas sim gravados na parte baixa do mesmo:
JOZE MATHEUS NOGUEIRA O MANDOU FAZER EM 1854 P'A IGREJA DE S. PAULO NA RB' QUENTE
Estes dados que se lêem nestes três sinos que pertenceram à segunda Igreja de São Paulo e hoje fazem parte do património da igreja actual, não só identificam o seu benemérito doador, como marcam a data do começo de uma grande viragem na vida religiosa do povo da Ribeira Quente, porque, como já foi dito, depois da construção do primeiro Sacrário feito por doação desse proprietário e médico José Mateus Nogueira, o lugar da Ribeira Quente se emancipou ou soltou das peias que o travavam a Ponta Garça, devido à sua subserviência religiosa.
Depois de ter paroquiado a Igreja de São Paulo durante nove anos, o seu maior mentor, o Padre Ângelo Amaral partiu para a América do Norte onde permaneceu e veio a falecer. Do livro de Assentos desta paróquia e da autoria de um pároco que veio a falar dele decorridos que eram catorze anos, lê-se:
"... a quem se ficou devendo o seu levantamento (da Igreja), pois era daqueles de quem se costuma dizer - 'antes quebrar que torcer' - arrostando contra todas as dificuldades etc.",
conseguiu não só levantar este templo, como buscou para o seu interior aquilo que então o povo da Ribeira Quente lhe não podia dar e que é sempre uma das obras mais dispendiosas de um templo: o retábulo.
Na realidade, sabendo o Padre Ângelo que, depois da implantação da República os energúmenos haviam despejado a Igreja da Graça de Ponta Delgada para ali implantar um tribunal, este sacerdote ultrapassou muitos obstáculos e conseguiu que o retábulo desta igreja fosse oferecido à da nova igreja que depois veio a inaugurar, como já foi dito, levando da mesma, também uma imagem de Nossa Senhora do Leite, a de Santa Teresinha, a de São Pedro Gonçalves - que havia sido Patrono dos pescadores da Calheta e de Santa Clara, que se desavieram por causa desta imagem quando a mesma foi trazida do seu primitivo altar, que existia naquela que veio a ser a Igreja de São José de Ponta Delgada, para a da Graça - assim como as imagens de Santo Agostinho, Senhor Morto, São João Evangelista e São Nicolau de Tolentino.
Para substituir o Padre Ângelo veio da mesma ouvidoria o Padre José Luiz Borges Vieira, natural de Água de Pau, que na altura deixou de ser pároco da Igreja de Nossa Senhora dos Remédios da Lomba do Loução.
Foi no seu tempo que foi feita a balaustrada que circunda o adro da actual igreja da Ribeira Quente, como foi no tempo deste que se tentou construir uma casa paroquial que não havia nesta localidade, a qual, por razões óbvias, nunca foi além de meias paredes.
Sem ser a forte vertente mar e igreja, mais nada constava acerca da Ribeira Quente, até que, no ano de 1927 veio a ser quebrada esta monotonia, com a construção de uma pequena muralha de protecção que partia da zona chamada "Prédio das Vieiras", até ao porto. Simples mas útil não como muralha de protecção, mas sim porque além dessa obrigação, permitia que antes de se entrar nas areias da praia que o mar ia repondo, houvesse umas dezenas de metros de caminho propriamente dito.
No ano seguinte, 1928, uma forte tempestade cortou quase totalmente este acesso, por isso foi aberto o caminho que o povo passou a chamar de estrada, conforme consta de um extracto paroquial:
"ANO DE 1928 - Neste ano há a registar nesta freguesia a abertura da nova estrada junto à rocha desde o princípio da freguesia até à igreja paroquial porque o mar já quase levou o antigo caminho junto à praia".
Já eram então decorridos, nessa altura, mais de 260 anos desde que a Ribeira Quente se havia tornado povoado, conforme consta dos apanhados históricos já mencionados acerca da suposta visita feita por D. Frei Lourenço de Castro. No entanto este lugar ainda não era freguesia.
As palavras acima referidas, "nesta freguesia" e "nova estrada", foram uma simples expressão então adequada para mencionar o acontecimento.
A "nova estrada", não era sinónimo de haver outra estrada, porque até àquela altura só havia sido feito (não pelo município), o pequeno paredão que ia da zona do actual porto para poente, o qual acabava, como já foi dito, no "Prédio das Vieira" ou logo pouco mais além da Rua Direita, e que servia só para pedestres antes de entrar na praia a parte da barreira composta por terras que o mar ia deixando e o povo da zona da Ribeira pisava para poder atingir a sua igreja.

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